DADOS EM JOGO NA GESTÃO UNIVERSITÁRIA – BLOG Volume 1 – Número 4

12/05/2021 09:15

AS SANÇÕES, AS MULTAS E ADVERTÊNCIAS FRENTE À CULTURA DE DADOS EM SAÚDE

PARTE II

De forma concreta, em primeiro de agosto de 2021, quando encerra o prazo para início de vigência das regras alusivas às penalidades previstas pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, setores da economia brasileira poderão restar impactados pelos efeitos e dispositivos sancionatórios da lei de dados. Em relação à saúde e seu “mercado”, essa lei tem gerado muitos questionamentos e dúvidas, como o curto prazo para que seja instituída uma governança de privacidade – capaz de imprimir certos comandos fiscalizatórios e sancionatórios de forma a que sejam observadas e cumpridas a legislação e outra, relativa à segurança, a oferecer mecanismos protetivos de significativa habilitação e convergência no tema da saúde.

Contudo, o setor é unânime em afirmar: a LGPD é necessária para a Saúde, situação essa que restou de destacada compreensão, frente às muitas demandas e frentes em saúde na sociedade brasileira, e potencializada pelas demandas do Coronavírus, em que, foi decisivo o apoio tecnológico e a presença de bancos de dados a incutir diretamente no estágio em que encontramos, a demandar privacidade e segurança, sobretudo, em termos de dados pessoais relativos à saúde. Senão pelas tecnologias habilitadoras, o atual estágio em que se coloca a humanidade, poderia ser diverso e inferior.

A saúde, no conjunto de seu significado, conforme definiu a Organização Mundial da Saúde (OMS), é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença ou enfermidade. Corroborando, em relação à saúde mental dos indivíduos, a mesma angaria outros atributos de maior complexidade, cujas ações permitem às pessoas adotar e manter estilos de vida saudáveis, sendo que, diversos fatores contribuem para colocar em risco a saúde mental dos indivíduos; entre eles, rápidas mudanças sociais, condições de trabalho estressantes, discriminação de gênero, exclusão social, estilo de vida não saudável, violência e violação dos direitos humanos.

Referido conceito dá conta da importância destacada de dados na identificação da saúde mental, seja para sua gestão, como também, na referência de sua dimensão administrativa, concepção de políticas públicas, e programas de governo, de onde decorre que a gramática dos dados pessoais em termos de saúde, necessita de rigoroso encadeamento e articulação política a dar conta de promover, proteger e defender a saúde de todos, para todos e com todos.

Sem dúvida, uma importante consideração a respeito da saúde, e de que dão mostras a COVID-19, tem-se na condição chave para medir os dados em saúde, para que os tomadores de decisões detenham melhor acesso às informações relevantes. Nessa linha, os indicadores são verdadeiros instrumentos a quantificar e conferir qualidade aos dados técnicos e disponibilizá-los às redes, de forma que os técnicos, o pessoal da saúde e o próprio governo tenham uma visão real do que precisa ser feito. Trata-se, pois, de tecnologias habilitadoras.  Sato (2021) revela que “Um bom indicador alerta sobre um problema antes que ele se torne muito grave e indica o que precisa ser feito para resolver tal problema. Em comunidades em crises (sejam sociais, econômicas ou ambientais), os indicadores ajudam a apontar um caminho para a solução dessas crises, e assim para um futuro melhor”.

Ocorre, a esfera social – e muito mais a econômica – tendem a concentrar toda a atenção, razão pela qual, na tomada de decisões políticas, normalmente são adotados indicadores econômicos com maior ênfase. Entretanto, para monitorar e avaliar os dados em termos de saúde, podem ser necessários indicadores comparativos. Um indicador econômico não leva em conta os efeitos sociais, assim como esses indicadores não refletem ou não consideram os efeitos econômicos, de onde decorre que, indicadores tradicionais para ter sucesso, e dar conta da melhor informação, necessitam de qualidade, presente em uma dimensão mais integrada na esfera da comunidade, especialmente, nos moldes conforme a atualidade já deu conta: a questão tecnológica demanda o aparelhamento de dados, a munir e medir as janelas de oportunidades e do bem-estar, tão importantes à qualidade da saúde.

Seja como for, esse período, que vai desde a publicação da lei, passando por sua entrada em vigência plena e enquanto permanecer em vigor – a incluir as sanções, as multas e demais penalidades – devem levar em consideração que foi um período tumultuado, em que a sociedade presenciou aos poucos, um sentimento de descrença e de crença, em que não faltou a imputação “trata-se de mais uma lei”, como, também, em outra ponta, pode ter sido incutido uma exagerada e presente confiança no rigor da lei.

Exagerada porque, sem cultura de dados, a lei não poderá, sozinha, dar conta de alcançar o alvo dos objetivos da LGPD, constituídos por seus fundamentos, conforme dispostos no artigo 2º da Lei 13.709, de 2018: o respeito à privacidade; a autodeterminação informativa; a liberdade de expressão, de informação, de comunicação e de opinião; a inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem; o desenvolvimento econômico e tecnológico e a inovação; a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor; e os direitos humanos, o livre desenvolvimento da personalidade, a dignidade e o exercício da cidadania pelas pessoas naturais (BRASIL, 2021). Nem tão pouco, poderá dar vazão a uma dinâmica e cultura de dados que necessita estar presentes de forma a conferir verdadeira proteção e segurança aos dados em si.

Ora, o despontar da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais consolidou uma preocupação que já vinha sendo sentida, discutida e traduzida em vários setores, inclusive, no contexto pertinente à saúde. Notadamente, em relação às multas, sanções e demais penalidades da LGPD, espera-se que as mesmas sigam seu cronograma de validade, conforme encontra-se previsto na referida lei.

Seja como for, dentro em breve, (muito provavelmente em 1º de agosto de 2021), a totalidade das disposições presentes na LGPD estarão em vigência, inclusive as multas. A estruturação dos organismos de fiscalização é uma necessidade imperiosa, pois a correta aplicação da legislação assegura a proteção de direitos pessoais, direitos estes fundamentais e que redundam na salvaguarda de todos os aspectos da personalidade, entre outras situações que estão correlacionadas.

Em contraponto às recentes notícias e a questão da regulação das multas pelas infrações frente à inobservância das regras pertinentes à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, tem-se um cenário bastante grave, pois houve diversos vazamentos de dados pessoais a partir de diversos bancos de dados, como o do SERASA EXPERIAN (VENTURA, 2021), de onde vazaram 223 milhões de CPF’s e 40 milhões de CNPJ’s. Além dos vazamentos de dados telefônicos de mais de 100 milhões de brasileiros (URUPÁ, 2021).

Basicamente dados de toda a população foram vazados, e, diante de tal razão, decorre o questionamento sobre a questão da aplicação das multas. O primeiro ponto a ser observado está relacionado com a precária situação da proteção de dados no país; o segundo ponto diz respeito a que, quanto às sanções, multas e penalidades decorrentes, a LGPD aguarda sua vigência; e o terceiro ponto, resta evidente, que ainda não estão presentes uma adequada cultura de dados, nem, tão pouco, podem ser reconhecidas seguras boas práticas de proteção de dados.

Portanto, dando azo ao jargão popular de que, não se trata de evitar o vazamento, mas de quando ele vai se dar, empresas e órgãos governamentais poderão, por um ou vários modos, sofrer ataques aos seus respectivos bancos de dados, consoante dão confirmações as situações antes referidas, com o consequente vazamento de dados pessoais a dar margem à aplicação das penalidades previstas pela LGPD. Quanto aos dados pessoais em relação à saúde, de natureza sensível, os mecanismos de privacidade e de segurança necessitam de vigilância criteriosa: homem e máquina, criador e criatura, deverão comunicar-se em sintonia.

 

Referências:

BRASIL. Lei 13.709, de 14 de agosto de 2018. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2018/lei/l13709.htm. Acesso em: 18 abr. 2021.

SATO, Ana Carla Kawazoe. Índices de Sustentabilidade. Disponível em: https://www.unicamp.br/fea/ortega/temas530/anacarla.htm. Acesso em 17 abr. 2021.

Relatório Global de Riscos. World Economic Forum. Relatório de Análise. Em parceria com Marsh & McLennan e Zurich Insurance Group Relatório de Análise. 15ª ed., 2020.

VENTURA, Felipe. Serasa é alvo de processo que pede multa de R$ 200 milhões por vazamento. Disponível em: https://tecnoblog.net/412923/acao-judicial-pede-multa-de-r-200-milhoes-a-serasa-por-vazamento/. Acesso em 17 abr. 2021.

URUPÁ, Marcos. ANPD apura vazamento de dados telefônicos de mais de 100 mi de brasileiros. Atualizado em 11/02/21. Disponível em: https://teletime.com.br/11/02/2021/anpd-apura-vazamento-de-dados-telefonicos-de-mais-de-100-mi-de-brasileiros/. Acesso em: 17 abr. 2021.

 

Por:

  1. Geralda Magella de Faria Rossetto
  • Doutoranda pelo Programa de Pós-Graduação em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, sob a orientação da Profa. Dra Josiane Rose Petry Veronese.
  • Mestre em Direito Público pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS).
  • Membro da Rede Universitária para Estudos sobre a Fraternidade (RUEF), que reúne pesquisadores de diversas instituições, nacionais e internacionais.
  • Pesquisadora do DataLab – Laboratório de Desenvolvimento e de Pesquisa em Gestão de Dados – UFSC; do Núcleo de Pesquisa Direito e Fraternidade – UFSC; e do Núcleo de Estudos Jurídicos e Sociais da Criança e do Adolescente – NEJUSCA;
  • Procuradora Federal da Advocacia Geral da União (AGU), aposentada.
  • Advogada, com ênfase em LGPD.
  • Organizadora e Autora de diversos capítulos de livros.
  1. Messias Silva Manarim
  • Mestre em Filosofia pelo Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC.
  • Bacharel e Licenciado em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC.
  • Graduado em Direito pela Universidade do Extremo Sul Catarinense – UNESC.
  • Advogado.

Em: 12/05/2021